O Brasil está se destacando como um player chave no desenvolvimento de combustíveis sustentáveis para a aviação (SAF — Sustainable Aviation Fuel). Com base em estudos da Roundtable on Sustainable Biomaterials (RSB) e da gigante da aviação Boeing, o país sul-americano está no caminho para gerar bilhões de litros de combustível ecológico a partir de resíduos agrícolas e industriais. Nesta matéria, exploraremos o potencial do Brasil nesse setor em ascensão, abordando a relevância dos resíduos de cana-de-açúcar, madeira, gordura animal, gases industriais e óleo de cozinha, bem como outras matérias-primas emergentes.
Resíduos como matéria-prima do SAF
De acordo com as estimativas da RSB e da Boeing, o Brasil tem a capacidade de produzir um impressionante total de 9 bilhões de litros de SAF a partir de resíduos. Desses 9 bilhões, a cana-de-açúcar se destaca como a principal fonte, contribuindo com 6,48 bilhões de litros. Os resíduos madeireiros seguem em segundo lugar, com 1,9 bilhão de litros, seguidos pela gordura animal (0,36 bilhão), gases de escape de processos industriais (0,23 bilhão) e óleo de cozinha usado (0,11 bilhão).
Outro estudo realizado pela ONG de preservação ambiental WWF e pelo Instituto Internacional de Análise de Sistemas Aplicados (IIASA) destaca ainda mais o potencial brasileiro, incluindo matérias-primas como macaúba, sorgo e a própria cana-de-açúcar. A abundância dessas matérias-primas e sua disponibilidade em mercados já consolidados tornam o Brasil um candidato ideal para a produção do combustível ecológico de aviação.
Excedente para exportação
A professora Laís Forti Thomaz, da Universidade Federal de Goiás (UFG) e pesquisadora da Rede Brasileira de Bioquerosene e Hidrocarbonetos Sustentáveis para Aviação (RBQAV), enfatiza que apenas com os resíduos já existentes, o Brasil poderia atender à demanda nacional por querosene de aviação. Isso abre oportunidades para exportação e a possibilidade de suprir demandas crescentes, como as dos Estados Unidos e da União Europeia.
A cana-de-açúcar emerge como uma das principais opções de matéria-prima para a produção de SAF no Brasil. A produtora de biocombustível Raízen, por exemplo, obteve recentemente a certificação internacional ISCC CORSIA Plus, validando seu etanol produzido em Piracicaba (SP) como adequado para a produção de SAF. Projetos que exploram a produção de combustível ecológico a partir de soja, milho e macaúba também estão ganhando destaque.
Macaúba como uma promissora alternativa
A empresa de refino Acelen, subsidiária do fundo árabe Mubadala que opera a Refinaria de Mataripe (BA), está investindo R$ 12 bilhões em um projeto de produção de diesel verde e SAF. Seu foco está na macaúba, uma palmeira cujo óleo tem a capacidade de produzir até sete vezes mais combustível do que a soja. Isso demonstra o potencial de matérias-primas alternativas e sustentáveis.
Até mesmo a glicerina, um coproduto da indústria de biodiesel com alto valor energético, está no radar. O Senai-RN e a Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável inauguraram a primeira planta-piloto para a produção de SAF a partir dessa matéria-prima em Natal (Rio Grande do Norte) em setembro. Isso mostra a diversificação das fontes de matéria-prima para a produção de SAF.
Desafios a serem superados na produção do SAF
Apesar do potencial impressionante, a produção de SAF ainda enfrenta desafios, principalmente em relação aos custos. A professora Laís Forti Thomaz destaca que, dependendo da rota tecnológica e da matéria-prima utilizada, os custos podem variar. No entanto, ela ressalta que o investimento em pesquisa e desenvolvimento pode ajudar a reduzir esses custos, tornando o SAF mais competitivo.
O Brasil está no caminho certo para se tornar um importante produtor de combustíveis ecológicos e sustentáveis de aviação (SAF), aproveitando uma variedade de matérias-primas, desde a cana-de-açúcar até a macaúba e a glicerina. Com a crescente demanda por alternativas sustentáveis, o país tem a oportunidade não apenas de atender às necessidades nacionais, mas também de se destacar no mercado internacional. À medida que a pesquisa e o desenvolvimento avançam, podemos esperar que o custo desses combustíveis diminua, tornando o SAF ainda mais atraente para o meio ambiente e a economia.